sábado, 24 de setembro de 2011

Escova de dente



Apaixonei desde que a vi de chinelos havaiana e short em um shopping na Zona Sul. Não gosto do modismo da elite carioca – que mudem pra São Paulo as burguesinhas do Rio! Ela estava sozinha. Queria me aproximar, mas não fui homem o suficiente pra isso. Pensei em segui-la, mas logo desisti. Também seria piegas demais.

- Corre, meu bem, a Ana Maria Braga tá começando a fazer a torta de chocolate.

Nunca gostei de assistir programas culinários, mas "quinta é dia do chocolate na Ana, anjo!" – foi o que ela me disse no dia que levou a escova de dente lá pra casa. O suficiente pra que eu começasse a trabalhar depois das dez nesse dia.

- Pra que anotar isso, meu amor? Não tem tudo na internet?

Precisava distraí-la para roubar-lhe um beijo que, especialmente nas quintas, tinha sabor de chocolate. Meu favorito. Levei o café na cama. Café puro mesmo. Ela gostava do mais forte e quase sem adoçar, eu preferia os melados...

- Amor, pode comprar uma barra de chocolate meio amargo quando tiver voltando do trabalho?

Ela mal sabia, mas qualquer pedido era uma ordem. Foi assim quando nos beijamos pela primeira vez. Estava no clube democráticos, na Lapa. Era dia de forró e eu não sabia dançar. Por que fui lá, então? Boa pergunta! Não sei exatamente. Fiquei sentado numa mesa, cheio de tédio. Pedi uma cerveja, mas antes que chegasse senti alguém puxar meu braço "dança comigo?". Era ela. Sim. A moça havia trocado o short e os chinelos por um par de sapatilhas e uma saia rodada.

Eu não sabia dançar (acho que eu já disse isso), mas também não consegui dizer um não pra ela...

- Ih, amor. Acho que a essência de baunilha acabou, você compra também?

Lembrei! Tinha gosto de baunilha o primeiro beijo que eu roubei bem ali, no meio da pista. Foi um pretexto que arrumei pra que ela não percebesse o meu desjeito. Ótimo pretexto, diga-se de passagem.
Ela sempre ria dos meus clichês. Gostava dos meus devaneios. Conseguia entende-la, só de olhar em seus olhos – e vice-versa. Éramos coniventes...

Não entendi e continuo sem entender o que aconteceu. Ela simplesmente partiu. Deixou somente uma carta de despedida. Não tinha mais apelidos carinhosos...

Meu café nunca esteve tão amargo quanto agora. Quando ela saiu pela porta não levou apenas suas roupas, nem o pouco de mim que ainda restava... Ela foi além. Levou o sabor adocicado de nossas cumplicidades. Mas a escova de dente ainda estava no meu banheiro.
Fernando Duarte Pazzini*

* Fernando Duarte Pazzini, vulgo F.D.P., é uma das minhas personagens que está brincando de ter vida própria. 

3 comentários:

  1. Sou completamente solidário ao seu amigo Fernando. Pode deixá-lo escrever mais, porque ele tem mesmo merecido direito a respostas. :)

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  2. Joyce,
    Coitado deste F.D.P, ele tem mais é que desabafar mesmo uai... Tenho até pena dele! Siga em frente menina! Beijus
    Tia Zina

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  3. Mas precisava o Fernando ser mineiro tb? Ele entregou a origem logo que disse: "Apaixonei". Só mineiro diz isso. O resto do Brasil SE apaixona... rsrsrs

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